O raríssimo valor do voluntariado
Paula Custódio Reis
Trabalho num serviço público desde o início do século. Um serviço que atende muitos utentes, muitas entidades e que tem obrigação de também as acompanhar com uma certa dose de fiscalização.
Conheço bem este serviço. Tem uma sede nacional, uma delegação regional e os serviços de proximidade.
Há quase vinte anos, na unidade onde trabalho, éramos quase o dobro. Tínhamos autonomia na análise e o dirigente tinha autonomia de decisão sobre essa análise. Os papéis eram mais, mas os procedimentos burocráticos eram menos.
Pertencemos a um Ministério cuja orgânica é grande e pesada. Somos muitos, e os graus de decisão muito escalonados. Mas este é um Ministério, cuja boa ação é fulcral para todos os que acreditam no Estado Social. E cuja má imagem convém aos que preferiam que ele fosse mínimo e simplesmente caritativo.
Caridade é uma palavra da qual não gosto em particular. Aqui, nesta região que tanto precisa de um Estado Social forte, aprendi que o que devemos aos outros é a solidariedade desinteressada. Porque, entre outras coisas, a misericórdia que devemos aos mais velhos, prende-se com as condições de vida dura, que sempre tiveram para aguentar vivo este território. Porque a vida, por aqui, nunca foi fácil.
Mas sobre os trabalhadores do Estado, lembro que somos o tipo de trabalhadores a quem a sociedade atira culpas, quando o País percebe que não se acautelou a economia.
À conta disso, reduziram-nos o salário, aumentaram as contribuições do subsistema de saúde de que usufruímos, mas que pagamos religiosamente todos os meses, congelaram as nossas perspetivas de melhor futuro.
Como somos uma unidade com pouca gente, mas com um âmbito territorial enorme (que também foi acrescentado nos últimos anos), já não podemos dizer que temos facilidade em conhecer todo esse território. De Monfortinho à aldeia mais recôndita do Concelho de Oleiros, sem pressas e, com sorte, sem avarias, no mínimo calculo umas duas horas de viagem…
No entanto estamos cá. A fazer o melhor que podemos. A ser os últimos representantes do Estado direto, nesta região que muitos querem esquecida.
E estamos cá a fazer bem. A trabalhar em parceria. Em parceria com os nossos públicos e com os outros que também são Estado. A trabalhar com o terceiro setor, com o voluntariado e com todos os que queiram trabalhar connosco.
E até acumulamos papéis, muitas vezes. Porque também somos voluntários, associados, dirigentes, autarcas.
E perdemos do nosso tempo, da nossa disponibilidade, do nosso lazer. Mas ganhamos em sentido de dever.
Se eu acredito em acontecimentos raríssimos? Óbvio. A ganância e o deslumbramento são próprios do ser humano.
Mas, sinceramente, na maior parte dos casos, este tipo de voluntariado formal ou informal, o acrescento individual que tem, é o da realização pessoal, por fazer algo de que se gosta.
Pessoalmente sinto que não ficaria bem comigo, se não participasse da obrigação de colaborar na construção do bem comum.
Lembro-me que, durante os incêndios, um familiar dizia-me «Quando explicas a um estrangeiro que o combate aos incêndios é feito por Bombeiros Voluntários, que põem a sua vida em risco, eles ficam surpreendidos». E porquê? Porque esse tipo de desapego é a melhor característica deste povo voluntarioso que somos. E é raro de encontrar.
E este voluntariado assenta num gosto, que é o de ajudar o outro. Diriam os grandes teóricos que temos uma grande inteligência emocional…
Eu, por mim, vou continuar a tentar valorizar mais quem dá o seu melhor todos os dias. Seja ele um interventor formal do Estado, seja um qualquer voluntário que, por o ser, torna a vida em comunidade mais humana. E vou continuar a participar e a ser uma associada contribuinte.
Quanto ao resto, bem, talvez seja hora de uma revolução dos costumes. Dum assumir de que, a todos resvala o pé para o pedido do jeitinho ou para o estacionamento mal feito porque temos pressa… E que mudar também começa por aí: respeitar as regras para poder exigir que elas sejam respeitadas…
Como a vida não dá saltos e o tempo leva tempo, espero o reforço de um verdadeiro papel de acompanhamento/fiscalização do Estado, a fim de que, quem erra seja afastado e quem cumpre seja premiado.
E porque é tempo de Festa da Luz, de Solstício e de Natal, desejo a todos um grande ano de 2018 e uma festividade plena de Luz.