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Mai17
O que é que ainda sabemos do que é nosso?
Paula Custódio Reis
Ontem, ouvi da importância de incluir nos nossos percursos educativos, os ensinamentos daquilo que é imaterial, relativamente aos sítios que habitamos.
A ligação da educação à herança deste património dos saber fazer, e dos saber ser, é fulcral para que ele se mantenha.
Conseguir identificar e classificar um património material ou imaterial, não é o mesmo que conseguir saber como esse património foi construído, como era usado e toda a riqueza das histórias (e estórias) a ele ligadas.
Fizemos (Associação Cantar de Cuco), este fim-de-semana a Rota das Levadas. Tem início em Louriçal do Campo, sobe até ao caminho do Meio, onde podemos lançar a vista a Monsanto, à Raia fronteiriça até ao Alto alentejo e a todo o Campo Albicastrense e, depois de passar por uma magnífica obra, saída da imaginação do Arquitecto Salles Viana, começamos a descer o «Canhão do Ocreza» até chegarmos à aldeia da Torre.
Nesta Rota tentamos dar a conhecer um sistema de transporte e aproveitamento de água centenário, que são as levadas (vem do tempo dos Romanos), uma indústria que foi à época intensiva, que era a das azenhas, que fixou populações, que criou caminhos que ainda hoje existem, que atraiu mestres de outras áreas (pedreiros, comerciantes, agricultores). E, no entanto, continuamos a surprendemo-nos quando constatamos que esta nossa Ocreza, junto à Gardunha, continua a ser desconhecida, quer para os habitantes da própria freguesia, quer para o resto do Concelho e região, onde estas azenhas tinham a sua área de influência (iam até à Idanha recolher trigo, dizem).
Tenho para mim, marcadamente presente, a necessidade urgente de trabalhar estes museus vivos que são as comunidades rurais, porque são elas que sempre nos permitem recentrarmo-nos quando perdemos o nosso Norte. É parando, libertando-nos de quaisquer influências externas que conseguimos pensarmo-nos. Questionar-se deveria ser um dos grandes pilares da vivência humana.
Quando a espiral de facilitismo, que as novas tecnologias e as vivências citadinas constroem, nos faz perder o sentido, é preciso parar e perguntar porquê e para quê. Por exemplo, alguma vez se perguntaram porque é que o telefone móvel tem um toque de chamada que é um excerto de uma música? O que é que isso acrescenta? Qual é a mais valia que a tecnologia veio trazer com isso? Estamos a desperdiçar recursos, a inventar inutilidades, que seriam melhor aplicados noutras áreas, que trariam mais felicidade ao ser humano.
O que é que afinal, nos andamos a fazer a nós próprios, ou melhor, o que é que andamos a deixar que façam da nossa vida e das nossas escolhas? A ilusão de liberdade, a ilusão de que todas as decisões do nosso viver são nossas, é, para mim, a mais perigosa das ilusões, porque nos torna seres sem vontade e identidade próprias. E é a identidade, é o uso das características marcadamente pessoais que determinam uma existência plena. É a partir do encontro das diferentes existencias, do seu confronto e somatório, que a humanidade evolui.
De contrário, estaremos somente a sobreviver.